30/10/2015

* 2015 - UMA NOITE INFINITAMENTE MÁGICA EM BLUMENAU

Era 1º de maio, 20h e todos os convidados já estavam ao redor de duas grandes fogueiras que reluziam charme e sensualidade no quintal da Bruxa Alicia[1], uma mulher de 30 anos, cabelos loiros cacheados até o ombro, que reside desde criança no bairro da Velha, em Blumenau. Sua casa é cheia de vida, á gatos, cachorros e passarinhos que fazem a festa em sua casa, vivendo em perfeita harmonia... "Até parece que sabem o que estamos fazendo aqui", comentou uma das convidadas que olhava com desconfiança para o gatinho alaranjado que espiava pela janela da sala, confesso que até eu estava um pouco aflita. Não gosto de gatos, pois sempre os associo com algo sinistro, o que aos poucos fui compreendendo que não passava de mero pré-conceito que adquiri ao longo da vida. 
Estávamos em 13 pessoas, homens e mulheres das mais variadas idades e profissões. Haviam advogados, dentistas, donas-de-casa, estudantes e professores... enfim pessoas comuns que estavam ali por um único objetivo: celebrar o Beltane[2] em comemoração a Rainha de Maio.

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Alicia não é uma bruxa comum, com sua delicadeza de princesa, estava mais para bruxa dos tempos modernos. Durante a celebração do Beltane vestia um vestido branco e longo para simbolizar a pureza, e alguns adornos pelo pescoço que segundo ela “se sentia mais feminina para a ocasião”, nada parecida com aquelas bruxas das historias em quadrinho que aparecem sempre vestidas de preto, com um chapéu enorme e um narigão horroroso que assustava quem chegasse perto. 
Nós que não estávamos nem um pouco acostumados com comemorações como estas, estávamos trajados normalmente sem nenhum capricho em particular, apenas levávamos algumas raízes (batatas e cenouras) e um copo de vinho para comemorar a data. Mas como em todas as regras á exceções, uma das adolescentes que estava conosco para participar da celebração, veio vestida de chapéu e capa preta, que segundo ela "não deixaria por nada nesse mundo de participar de uma festa de bruxas sem estar a rigor". Todos acharam graça da jovem adolescente, mas concordamos num fato: ela leva jeito para bruxa! Todos os convidados, inclusive eu, estavam ansiosos para a grande noite. 
Não era uma data comum, pois estaríamos festejando o Beltane, que segundo os celtas[3] (Alicia se encarregou de explicar tudinho antes de começar o ritual) "é a mais alegre e festiva comemoração celta é uma data profundamente sensual”. Aos poucos, antes de dar inicio a celebração, íamos, nos familiarizando com o significado do Beltane, de acordo com a lenda representa a entrada do jovem Deus para a idade adulta, que se da inicio pelas energias da Natureza, pela força das sementes e flores que desabrocham, onde a Deusa e o Deus se apaixonam. E por isso o dia 1º de maio para os celtas é marcado pela celebração de rituais de fertilidade e imensas fogueiras são acesas em todas as partes do mundo. Elas simbolizam o calor  da paixão e a intensidade da interação entre a Deusa e o Deus, e a crescente fecundidade da terra. Era evidente que estávamos nervosos, pois estávamos entrando em um mundo totalmente diferente do que aquele que estávamos acostumados. Para nos, falar de bruxaria é imaginar atrocidade cometida com animais ou alguma magia negra para afugentar pessoas indesejáveis em nossas vidas.

Quem poderia nos garantir que no meio daquela fogueira não poderia brotar um "demônio" ou algum "anjo mal" para correr com todos nos dali? Estávamos com medo, mas o pavor e a ansiedade foi , tomada aos poucos pela curiosidade e a grande sensação de paz que em doses homeopáticas foi tomando conta do ambiente. Chega o momento esperado, ficamos de mãos dadas e em circulo ao redor das fogueiras. Alicia, adoravelmente misteriosa recita alguns versos celtas, e nos pedia que repetíssemos dando inicio a celebração de fertilidade. De acordo com Alicia, as duas fogueiras acesas no centro do quintal, representava um costume celta que significava livrar-se de todas as doenças e energias negativas e purificar o ambiente. A bruxa nos explicou que nos tempos antigos, costumava-se passar o gado e os animais domésticos entre as fogueiras com a mesma finalidade. Assim com o passar dos anos, veio o costume de "pular a fogueira", que é realizada nas festas juninas, que simboliza exatamente isso: a purificação. Achamos superinteressante a explicação e continuamos cantando e dançando ao redor das fogueiras. 
A sensação era indescritível... Talvez o vinho tenha contribuído para que nos sentirmos mais soltos e purificados, mas a verdade era que sentíamos a energia da terra subindo pelas nossas pernas e por incrível que pareça a natureza se fazia mais presente naquele instante: uma forte sensação de paixão e esperança fazia parte de todos nos naquele momento. Será magia? Ou será que simplesmente o amor do Deus e da Deusa de Maio que estavam transbordando de paixão em nossos corações? Depois de celebrarmos em conjunto ao redor das fogueiras, Alicia nos convidou gentilmente para participar de outra tradição celta: o Maipole[4]  ou simplesmente "Mastro de Fitas", onde cada um de nos escolhe uma das fitas coloridas que fica em volta do mastro e assim todos vão girando e trançando as fitas, como se estivéssemos tecendo o próprio destino e o colocando sob proteção dos deuses. Foi um momento muito divertido, e a essa altura todos nos já estávamos completamente enturmados e contagiados com o a paixão de Beltane. 
Alicia se encarregou de explicar que esta tradição do Mastro de Fitas também foi incorporada as festas juninas. Os gatos, cachorros e passarinhos de Alicia não faziam mais diferença para nos. Muito pelo contrario já faziam parte de nossas vidas. Percebemos ao final da celebração que a magia daquela noite havia contagiado ate mesmo os animais, pois passaram todo aquele tempo em volta de nos, como se participassem e entendesse todos os nossos movimentos. Creio que naquela noite deixei a antipatia pelos gatos e agora já sinto que posso conviver com eles, pois todos nos fazemos parte de uma mesma natureza, racional que precisa ser celebrada e honrada todos os dias. Depois dos rituais, já passava da meia-noite, ajeitamos tudo e ajudamos a bruxa a organizar tudo em seus devidos lugares (os gatos pareciam fiscais pois nos seguiam aonde íamos) e partimos para nossas casas. Cada um de nos levou um pouquinho daquela noite dentro do coração. A experiência foi única e provavelmente diferente para cada um de nos que participou da celebração Muitas vezes deixamos de conhecer novas experiências, por puro preconceito ou medo de conhecer o que se passa depois da nossa porta. Cada um tem uma historia para contar, e a maior gratificação da vida é conhecer e buscar momentos novos para fazerem parte de nossas vidas. Deixamos de viver por medo, por arrogância, por despeito. Mas a vida e muito mais do que aquilo que conhecemos é uma janela que deve estar aberta todos os dias, a espera de experiências novas e o toque dos raios solares que ultrapassam esses limites serve para dar vida a nossa alma. 
Conhecer um pouquinho das tradições celtas, através da bruxaria, foi apenas uma das infinitas experiências que podemos passar, e oxalá que possamos conhecer o mundo através dos nossos sonhos que num toque de mágica podem se tornar realidade? A venda dos nossos olhos não é nada senão a nossa própria ignorância para a beleza do mundo. Só quem arrisca em conhecer o belo pode se dizer conhecedor de seus limites e a vida se resume na procura da felicidade, e a felicidade está em nossos corações.

Autora: DALVA  DAY – 2003  - CURSO DE SERVIÇO SOCIAL  - DISCIPLINA: ANTROPOLOGIA  

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